sexta-feira, 10 de outubro de 2014

México

A culinária mexicana não se resume apenas a tacos e salsas picantes (eu pensava isso). O mundo está descobrindo os ricos pratos mexicanos. Esse movimento começou por volta de 1970 com os livros da inglesa Diana Kennedy mostrando a cozinha regional do México e os inúmeros ingredientes usados, como a flor da abóbora e a carne das opúncias (plantas da família das cactáceas, como a palma).

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Muitos pratos indígenas são mantidos inalterados por séculos e também houve a incorporação na culinária de frutos, legumes, carnes, cereais e especiarias vindos da Europa. Isso causou o enriquecimento dos pratos, como os crepes de cogumelos, tigelas fumegantes com menudo (miúdo), carne de porco assada no espeto temperada com achiote (urucum) e laranja amarga e limas cristalizadas recheadas com coco ralado.

Os cereais desempenharam um papel central na cozinha mexicana. Há milhares de anos os caçadores nômades descobriram que podiam obter alimento substancial perfurando o solo com uma vara e introduzindo uma semente de milho. A planta era colhida, o milho era debulhado, preparado e consumido. Estes agricultores forjaram o padrão de uma cultura que se manteria durante cerca de três mil anos, como os Olmecas na costa do golfo do México e os Zapotecas nos vales elevados do sudoeste do país.

Quando os colonizadores europeus chegaram na região que seria conhecida como México floresciam vastas civilizações agrícolas. A tríade vegetariana – abóbora, feijão e milho – constituía o principal sustento do povo, embora nobres e sacerdotes comessem iguarias como codornizes e perus, pequenos cães sem pelo, peixe e caça selvagem e bebessem pulque (bebida alcoólica feita de agave) e o chocolate. O atole, uma papa de milho, era a primeira refeição do dia e a principal eram os tamales (espécie de pamonha), tortilhas e estufados, temperados com as pimentas chiles que faziam arder a boca.

Os colonos espanhóis trouxeram também uma cozinha impregnada do domínio mouro em gerações passadas. Vieram não só o gado e a criação, como também o trigo, o arroz, as cebolas, os alhos, os cítricos e a cana-de-açúcar. Os espanhóis também tiveram com os mexicanos os primeiros acessos ao milho, à grande variedade de feijões, aos amendoins, à batata doce, às abóboras, ao tomate e ao amaranto. As novas frutas também modificaram o paladar europeu e mundial, como o abacaxi, a goiaba, a papaia e o abacate, bem como o sabor da pimenta chile, do chocolate e da baunilha.  

O México foi dominado pela aristocracia espanhola durante cerca de 300 anos. Em 16 de setembro de 1810 o país proclamou sua independência. Após isso o país viveu outra fase de criação culinária: o México teve cerca de 50 anos de guerras civis com exércitos improvisados percorrendo montanhas e vales, com isso homens e mulheres tiveram que se adaptar a ingredientes de comunidades indígenas locais e também levavam seus conhecimentos culinários.

As guerras só terminaram quando os grupos conservadores se aliaram a Napoleão III da França. O México passou a ter um regime imperial em 1864, com Maximiliano e sua mulher Carlota. Eles instalaram no país uma cozinha europeia sofisticada trazendo um chef de cozinha húngaro, Tudor.
Mas o país continuou em conflito. Em 1876 o general Porfírio Diaz tomou o poder e ficou por 30 anos. Ele criou sua própria aristocracia, mas que manteve a influência europeia na culinária. Esse período durou até a Revolução Mexicana em 1920, com Emiliano Zapata e Pancho Villa. As mulheres, conhecidas como soldaderas, não só lutavam ao lado dos homens, como levavam consigo as comales (panelas de ferro) e cazuelas (panela de barro).

Com a estabilidade política a partir de 1930 o México teve um movimento de artistas e intelectuais para interpretar os valores do passado mexicano e promover o orgulho por sua herança. Na gastronomia isso representou uma lenta reavaliação criativa. Em boa parte do século XX os chefs e cozinheiros dos melhores restaurantes mexicanos davam importância demasiada a cozinha europeia.

Mas em 1981 um grupo de cozinheiros mexicanos criou o Círculo Mexicano de Arte Culinária, uma união para preservar, aperfeiçoar e promover os pratos regionais do México. A alimentação no país varia com a região, dependendo da população indígena original e das influências dos espanhóis e de outros povos a que essas regiões foram expostas.

Por exemplo, o norte do México é conhecido pela sua produção de carne de vaca e pratos de carne, enquanto que o sudeste do México é conhecido pelos seus pratos condimentados baseados em vegetais e carne de galinha. A culinária mexicana também combinou-se com a culinária do sudoeste dos Estados Unidos, formando a culinária tex-mex.

Em 16 de novembro de 2010 a culinária mexicana foi reconhecida como Patrimônio Imaterial da Humanidade pela Unesco. Recentemente também foi estabelecido o Conservatório da Cultura Gastronômica Mexicana, cujo objetivo é salvaguardar a raízes, identidade e continuidade da culinária do México.

Uma das técnicas culinárias mais famosas do México, presente em várias cerimônias, é a fabricação de pães. Cada estado, município e cidade tem o seu próprio pão. Prova disso são os muitos pães cerimoniais enraizados na cultura popular, especialmente desenvolvidos para as datas tradicionais como o el pan de muerto, a Rosca de Reyes, o pão de casamento ou o pão da Quinta-feira Santa.
O pão dos mortos é um dos componentes mais importantes das ofertas que são feitas nos dias 1 e 2 de novembro nas casas do México em honra de Todas as Almas. A origem deste pão vem de uma fusão de tradições pré-hispânicas e europeus.

El pan de muerto

No antigo México se costumava consagrar aos deuses o coração de uma donzela, que era revestido com amaranto. Após a conquista espanhola, a tradição mexicana foi modificada pela substituição do coração humano pelo pão com esta forma e feito de açúcar vermelho. Ao longo do tempo tem havido maneiras diferentes de fazer este tipo de pão para oferendas, de acordo com as tradições de cada comunidade mexicana. Por exemplo, na Mixteca Puebla os pães são feitos com formas humanas e são polvilhados com açúcar branco se eles são oferecidos às crianças mortas ou açúcar vermelho para os adultos.

Fontes:
PALAZUELOS, Susanna; TAUSEND, Marilyn. México: o mais belo livro de cozinha. Verbo: 1991. Lisboa/São Paulo.

http://www.ccgm.mx/

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