segunda-feira, 30 de março de 2015

Da época também custa menos

Sempre escrevi aqui que os alimentos da estação são mais saborosos e por isso devem estar nos pratos. Estudando gestão de restaurantes no Senac (sou aluno) descobri outros argumentos, econômicos, que fortalecem ainda mais o uso dos alimentos de época. 

E há ferramentas de gestão para conseguir dados estatísticos dos alimentos para evitar perdas e se planejar melhor. Sobre o desperdício, há formas de diminuir perdas com um controle mais adequado das mercadorias, dos pedidos e das sobras. Sobre o primeiro tópico existem diversos cálculos para acompanhar a manipulação e evitar perdas. Braga (2008) explica que uma grande parte dos insumos utilizados na preparação dos produtos não está pronta para o uso e necessita de manipulação, o que provoca perdas.

O dono do restaurante paga pela quantidade total, mas parte dela será jogada fora no pré-preparo. Portanto, devem-se registrar essas perdas para análise de custos e tomada de ações para redução de perdas.

Podem ser criadas tabelas para corrigir essas perdas em alguns insumos. Esse fator, chamado de fator de correção (FC), mede a relação entre o peso bruto (PB) e o peso limpo (PL) do alimento. Alguns autores chamam esse fator de indicador de parte comestível (IPC). Entende-se por peso bruto o peso na forma em que o insumo é adquirido; e por peso limpo o peso depois do insumo ser limpo e estar pronto para ser utilizado.

Por exemplo, se um restaurante adquiriu 20 kg de filé mignon e no pré-preparo pesou 15,63 kg, o fator de correção será FC = 20 / 15,63 = 1,28. No cálculo do custo, o valor pago pela carne será dividido por 15,63 e não por 20. Os desperdícios têm de ser considerados no custo.

Para diminuir desperdícios o FC ajuda a avaliar, por exemplo, os fornecedores.

“Às vezes, o restaurante opta por um preço mais baixo, mas precisa ficar atento aos desperdícios. Quanto maior o desperdício, maior o fator de correção e menor a qualidade do fornecedor. Os insumos de alto consumo ou caros precisam ser analisados com frequência e acuidade.” (Braga, 2008, p. 56)

Há épocas também em que certos alimentos estão fora da safra e apresentam problemas de qualidade com alterações significativas nas perdas. As variações apresentadas pelo fator de correção podem identificar esses períodos e ajudar a planejar medidas inteligentes, que permitam manter a qualidade dos pratos sem grandes elevações de seu custo, como a substituição por ingredientes similares de época ou porcionamentos menores.

Na luta diária para reduzir os desperdícios deve-se ter em conta que o FC é influenciado por vários fatores que podem ser melhorados ou levar a exclusão de produtos, métodos ou mesmo pessoas se forem insatisfatórios, como a região de cultivo; os vícios do produtor e do fornecedor do insumo, que muitas vezes não eliminam sujidades como pedras e outros materiais estranhos na colheita; o tipo do insumo; e os métodos, equipamentos e utensílios utilizados pelo restaurante no pré-preparo, além do fator humano, como um funcionário que não sabe a forma adequada de cortar um peixe.

A respeito do controle dos pedidos, muitos restaurantes utilizam na cozinha um controle dos pratos à la carte apenas de forma verbal, o que pode aumentar os erros. Os pedidos são digitados no caixa para discriminação em notas fiscais e registro, o que nesse caso é benéfico para análises futuras dos pratos menos ou mais pedidos. Mas não há um software específico para estudar esse banco de dados.

Fonseca (2014) destaca que uma comanda pode também ser automatizada. Nesse caso, os dados são anotados em uma comanda simples e transferidos para um computador, que irá automaticamente distribuir os pedidos nos seus respectivos setores de produção, como cozinha, bar, copa ou cambusa. Além disso, o computador já faz com que as informações sejam automaticamente somadas, elaborando assim facilmente um relatório consolidado por mesa e do movimento geral do restaurante. Com o cruzamento de dados podem ser verificados e ajustados os volumes de consumo, movimentação de estoque e volumes de compras. 

Alimentos da Estação - alguns exemplos

Abóbora cabotiã


Outono
Abóbora, abobrinha, acelga, alface, batata-doce, berinjela, brócolis, chuchu, mandioca, nabo, pimentão, quiabo, rabanete, tomate, vagem, repolho, abacate, banana, caqui, coco, goiaba, jaca, laranja, limão, maçã, maracujá, melancia, pera e tangerina

Inverno
Abóbora, abobrinha, batata doce, berinjela, brócolis, cará, cenoura, couve-flor, ervilha, inhame, mandioca, mandioquinha, nabo, acelga, alface, chicória (escarola), couve, espinafre, mostarda, repolho, banana, laranja, limão, mamão, melão, morango, pera, pinhão e tangerina

Primavera
Abóbora, abobrinha, alcachofra, berinjela, beterraba, cenoura, chuchu, couve-flor, ervilha, mandioquinha, nabo, vagem, alface, almeirão, catalonha, chicória (escarola), repolho, banana, caju, laranja, melão, morango e pêssego

Verão
Abóbora, abobrinha, agrião, alcachofra, alho, batata-doce, berinjela, cenoura, chicória (escarola), chuchu, jiló, mandioca, milho verde, moyashi (broto de feijão), nabo, pimentão, quiabo, rabanete, repolho, abacaxi, abacate, ameixa, banana, caju, coco, figo, goiaba, jaca, laranja, limão, maçã, manga, maracujá, melancia, melão, pera e uva

Os alimentos da estação são mais saudáveis porque apresentam maior abundância de seus componentes, como as vitaminas e sais minerais, por exemplo. É a programação genética de cada planta. Numa determinada época do ano, que pode variar de espécie para espécie, disparam os mecanismos reprodutivos aumentam as raízes e caules, produzem mais folhagens, geram as flores e os frutos.

Mas a produção natural só acontece quando a planta está no seu estágio mais sincronizado com o ecossistema, quando sua nutrição, desenvolvimento e vitalidade são plenos. Tudo isso é passado para cada parte da planta que frutifica e amadurece o tempo certo. Por isso seu aroma será inebriante, seu sabor prazeroso e salivador (dá água na boca), terá maior concentração de sumo e fibras (crocância), sementes maiores e entumescidas, vitaminas e sais minerais serão abundantes.

O alimento fora da estação perde muito dessas características. Perde seu cheiro característico, será mais seco e pobre nutricionalmente. Além disso, para serem produzidas fora da época certa, precisam receber grandes doses de fertilizantes químicos e agrotóxicos, insumos artificiais que são caros e tóxicos para todos (solo, água, ar, fauna, flora, produtor e consumidor).


Fontes: 
BRAGA, Roberto M. M. Gestão da gastronomia: custos, formação de preços, gerenciamento e planejamento do lucro. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2008.

FONSECA, Marcelo Traldi. Tecnologias gerenciais de restaurantes. 7ª ed. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2014.

MARTINS, L. - O Barato da Feira/São Paulo - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, 1999